2004: A Quietude vem aí!

Vivemos um momento de transição. Deixamos para trás um ciclo marcado pela energia do trigrama Lago enquanto entrevemos a nova energia do trigrama Montanha. Oscar Maron (RJ) e Wagner Canalonga (SP) – dois estudiosos do Yi Jing (I Ching) e professores da Sociedade Taoísta do Brasil – se reúnem, através da internet, para trocar idéias sobre o significado do atual momento

Jornal Tao do Taoísmo – n. 17 índice

No simbolismo do Yi Jing (I Ching) os oito trigramas representam princípios físicos, energéticos e psicológicos – uma síntese das forças que regem o homem, a natureza, a história e o universo.

Segundo o calendário chinês, cada ciclo de 20 anos tem a influência de um dos trigramas do Yi Jing (I Ching), que influenciam a dinâmica energética de toda a época.

De 1983 a 2003 a energia predominante foi do trigrama Lago que, no simbolismo do Yi Jing (I Ching), tem como característica principal a Alegria e representa a boca, o sorriso, o prazer, o diálogo, a comunicação, a mídia, a tecnologia, assim como o perigo oculto.

Pelos próximos 20 anos, de 22 de Janeiro de 2004 (ano 4701 do calendário chinês) até o início de 2024, a energia dominante será do trigrama Montanha. Como esse trigrama do Yi Jing (I Ching) representa a Quietude, os temas ligados a esse símbolo, tal como a busca da estabilidade, a meditação, a consistência interior, a conscientização e a reflexão sobre os bloqueios e os impedimentos, serão discutidos e vivenciados com maior ênfase.

Nesse período de transição entre um ciclo e outro, uma análise ponderada sobre o significado dos últimos 20 anos, marcados pela Alegria, é fundamental para se partir em busca da mais plena Quietude.

Wagner – Alegria, Alegria! Na nossa ponte-aérea, você fala daí que eu falo daqui! E nada melhor do que um bate-papo alegre e prazeroso, em clima de “happy hour”, para ilustrar esse Trigrama tão risonho que é o Lago! E depois a gente pode meditar em silêncio para equilibrar… Afinal, nada melhor do que a quietude para nos auxiliar a conhecer um pouco mais da Montanha que vem pela frente…

Também gosto da idéia de refletir sobre o que passou, antes de pensarmos no próximo período. Então vale a pena lembrar que o Lago nos remete a um momento do dia em que há um encontro entre as energias Yin e Yang: o entardecer. Nesta hora, a luz do dia está diminuindo e a escuridão da noite está chegando. Ou seja, é um período de transição, onde aquilo que enxergávamos claramente passa a não ser tão claro assim. Fica mais difícil perceber o contorno das coisas, das pessoas, dos objetos. Talvez por isso a confusão que você menciona: os contornos indefinidos podem ser interpretados como limites não muito bem definidos. Vale lembrar também o que as estatísticas mostram: neste período do dia aumenta a incidência de acidentes de trânsito! Porque começa a escurecer, fica mais difícil enxergar e os faróis do carro, mesmo acesos, não conseguem iluminar o caminho suficientemente. Na hora do prazer, não é fácil saber a partir de que ponto a alegria vira excesso. Como a cervejinha do “happy hour”, a alegria também pode embriagar, se não tiver limite. E, no exagero, o prazer do lago pode virar pântano…

Se o yin é subjetividade, parece que os nossos valores, nossos limites, nossas referências sociais passaram por um período de muitos questionamentos e indefinições, não é mesmo Oscar?

Oscar – Acho que a questão da natureza da alegria é anterior e até mais importante do que a noção e discussão dos limites e dos excessos, na busca da alegria. Existe até aquele ditado que diz: “nunca se deve cometer nenhum excesso, inclusive o excesso de não cometer excessos”… Há! Há! As vezes o “pequeno excesso” é até uma forma de reiquilíbrio. É importante refletir sobre o conceito da alegria, “para não comprar gato por lebre”.

Acho que a idéia do prazer do Lago virar pântano, que você se refere, é o ponto crítico do atual ciclo de 20 anos, que se encerra em 2003, regido pelo Trigrama Lago. No I Ching o verso “Alegria sedutora”, por ser a sexta e última linha, do Hexagrama Alegria – composto do Trigramas Lago sobre Lago – vai representar o fim do período Lago. Essa linha que pertence ao Trigrama externo simboliza o perigo do prazer do lago, virar pântano. É um alerta para que o homem não seja seduzido pela busca da alegria através da satisfação externa, para suprir uma carência interior.

Na crônica intitulada “a conquista da alegria”, o sábio taoísta Chuang Tzu, (369-286 a.C.) já dizia em sua época: “Os tigres da ansiedade estão sempre à espreita nos campos dos corações e mentes. Não estou certo se o que as pessoas fazem hoje em busca da alegria, realmente gera como fruto final a alegria. Comparo esse costume atual de buscar a alegria ao estouro de uma boiada, a um avanço atropelado, quase como se por medo de perder a própria vida. Mas assim mesmo o chamam alegria. Não sei bem se isso é alegria. Talvez não.”

E o mordaz cronista continua: “Riqueza, posição nobre, reputação, paladar extravagante, roupas sofisticadas (…) Se não consegue essas coisas, fica triste, chega a chorar. As pessoas só se preocupam com a forma externa. Não é estúpido? Até o que fazem pelas conquista das formas externas, na verdade os deixa bem distantes delas ”.

Pois é; se Chuang Tzu já dizia há mais de dois mil anos, que o homem vivia amargurado pelo trabalho incessante para acumular “grandes pilhas de coisas”, que jamais poderiam esgotar, e pela busca atropelada da sedutora alegria externa, imaginem o que ele não diria hoje se fosse cronista de um jornal.

Na sociedade de consumo contemporânea, em que tudo e todos estão em oferta nas vitrines da vida, a questão tornou-se crônica. As pessoas querem cada vez mais e mais. O slogan sedutor da busca da satisfação em nossa época efervescente é: “quero tudo muito, ao mesmo tempo, e agora!”.

E como no mundo moderno a cobiça, e a ambição são cada vez mais estimuladas – e muita lenha é posta na fogueira em função disso – o homem acaba perdendo a perspectiva do espírito, não do espiritual, mas do espírito enquanto essência das coisas.

O homem não pode ser prisioneiro de seus desejos, de suas ambições, de seus apegos, principalmente quando eles não têm base na realidade. No Yi Jing (I Ching) a 6a linha do Hexagrama “Alegria”, caracteriza esse conceito de superficialidade e ilusão com o verso “alegria sedutora”. Esse verso do Yi Jing (I Ching), simboliza o homem que se ilude com o mundo e com si mesmo. Representa uma pessoa que utiliza sorrisos e apelos sedutores para iludir o outro, e ilude tão bem que até a si mesmo consegue iludir. Essa ilusão emana de nós mesmos e se integra de modo complementar com os apelos das grifes e dos conceitos de Status Quo do mundo. Essa linha como observou Confúcio simboliza a negação da consciência.

Se resolvermos seguir as orientações da sociedade de consumo, para vivermos o maravilhoso estado de felicidade, vamos precisar de uma imensa lista de compras que se renova a cada instante.

A busca atropelada pela alegria externa faz com que as pessoas percam a cabeça. O estado de ânimo interior, quando dependente da conquista externa, gera temeridade, descontrole e instabilidade, e termina por dificultar até a própria conquista externa.

Ser feliz é o maior desejo do Homem, porém é preciso conquistar a alegria de forma correta, e não cometer erros comprometedores na busca. Quando o processo de sedução externa, alimentado pela ilusão interior, toma o controle da vida de um homem, ele passa a não ser mais senhor de sua vida e de seu destino. E desde que ele não é mais senhor, fica difícil reaver essa posição.

Mas que fique bem esclarecido: desapegar não significa renunciar ao mundo. Todos gostam de viver com conforto (viva a cidadania!), no entanto o real conforto está na alma. É possível possuir, ou não possuir a fama, a riqueza e o prestígio do mundo, sem ser possuído por ele. Acho que a questão é encontrar o eixo, o centro de equilíbrio e felicidade, que inabalável pela turbulência das circunstâncias externas, proporciona alegria por si mesmo…

Wagner – Importante o seu comentário, pois nos faz refletir sobre a natureza da alegria que o Trigrama Lago representa: a alegria do contentamento. Esta é bem diferente daquela alegria eufórica que extravasamos quando o Corinthians marca um gol (pode ser do Mengão também!), gritando, vibrando com a galera, fazendo tremer a arquibancada! E que apaga imediatamente assim que o adversário marca o gol da virada! A alegria do contentamento tem a cara do Lago: mantém a energia abundante no interior, enquanto o exterior mostra-se suave, plácido e tranqüilo. É só olhar o trigrama para ver. E mesmo que aconteça uma tempestade no exterior, apesar da superfície ficar cheia de ”ondinhas”, a água do fundo não se perde. Pelo contrário, o nível do lago até pode subir com a água da chuva! Ou seja, enquanto a alegria expansiva desgasta a nossa energia, dirigindo-a para o exterior, a alegria do contentamento nos permite acumular reservas de energia no interior. E esse é um dos principais atributos do Lago: o acúmulo de energia.

Interessante pensar que, assim como a energia acumulada no interior nos propicia o contentamento e a satisfação, também vale a via inversa! Ou seja, cultivar o contentamento e a satisfação interiores proporciona também um acúmulo de energia, o que, conseqüentemente, aumenta a nossa alegria de viver! E criamos assim um belo círculo virtuoso!

E já que falamos de acúmulos, acho que vale a pena observarmos também um outro movimento muito forte destes últimos vinte anos: a especulação financeira. Muita fala, boataria, intrigas, acúmulo de recursos, dinheiro, “frutos podres caindo das árvores”… Tudo a ver com o Lago! Empresas pequenas, grandes, enormes e até algumas gigantescas sucumbiram a este movimento do “todo poderoso mercado”, que não poupou nem mesmo as nações. Quanta quebradeira… E o Estado moderno enxergou sua vulnerabilidade diante da força independente do capital especulativo. Que a Montanha nos traga novos tempos…

Oscar – A especulação financeira corrói a estabilidade da nação, na mesma medida que a especulação da “alegria sedutora” exposta na 6a linha do Yi Jing (I Ching), cria falsas expectativas de alegria individual. Por isso no hexagrama Alegria, as linhas desfavoráveis são as linhas externas, que indicam a insegurança, as dúvidas, e a ansiedade do homem, na busca da alegria fora de si. A grande parte dos desejos, na verdade não é essencial, e terminam por deixar em segundo plano o aprimoramento interno. O homem pode viver de forma mais simples e com mais prazer, pois como dizia o célebre frasista Oscar Wilde: “a simplicidade é o último refúgio do sofisticado”.

Não é a toa que se no Yi Jing (I Ching), trocarmos todas as linhas Yin por Yang, e vice-versa, do Hexagrama “Alegria” (Lago sobre Lago), vamos obter o Hexagrama “Quietude” (Montanha sobre Montanha). Isso significa que a “Montanha/quietude” e o “Lago/alegria” são complementares, e devem ser harmonizados da mesma forma que o Yin e o Yang. Portanto, para se banhar no Lago interno da alegria é necessário encontrar a serenidade, a solidez e a quietude emocional da Montanha.

Se não existe silêncio, nem tranqüilidade interior, as reações diante dos fatos da vida serão sempre impulsivas, e as atitudes externas sempre confusas, porque vão estar de acordo com essas perturbações. Se uma pessoa não tem quietude interior, a consciência dela, vai agir em cima de que? Vai agir baseada em uma série de fragmentos confusos, e automaticamente de maneira inadequada, porque não tem estabilidade interior, e como o homem quer viver e gozar todos os prazeres da maneira mais rápida, intensa e aguda possível, a excitação excessiva faz com que ele perca consciência e crie muitos conflitos à sua volta.

A ansiedade excessiva gera a inquietação, que surge quando se deseja algo, que muitas vezes nem está definido, mas devido a seu estado ansioso, o homem vai buscar algo exterior, para corresponder ao estímulo que está sentindo (desequilíbrio). Toda essa confusão gera angústia, ansiedade e conflito a nível consciente e inconsciente. O obscuro objeto de desejo quando não é alcançado, traz um sentimento de frustração, e pode até ocorrer que o homem passe a ver a realidade que o contraria como inimiga e origem de todo o sofrimento, o que pode acarretar até um rompimento com o real, criando um mundo de ilusões, que pode tornar-se até um caso clínico.

Ah alegria! Como diz o sábio ditado popular: “aqueles que a buscam não a encontram; aqueles que a possuem não a procuram; aqueles que não a possuem procuram-na, e assim não podem encontrá-la”.

Segundo o Yi Jing (I Ching), a solução está tão perto de nós e é tão óbvia, que temos dificuldade em vê-la. Todos podem ser felizes se encontrarem e cultivarem dentro de si a alegria interna, que por meio do contentamento e da tranqüilidade interior, permite fluir e se comunicar consigo, com o outro e com o mundo, curtindo as boas coisas da vida, sem ser prisioneiro delas, e sem procurar nelas – portanto fora de si – a felicidade.

Shao Yong, o mestre de oráculos do Yi Jing (I Ching) Flor de ameixeira na Dinastia Song, se auto-denominava: “Senhor Felicidade”, e observou: “o sábio permanece sereno e desprendido, ele não poderia encontrar satisfação na busca do poder e da riqueza. A alegria nasce quando se descobre que estamos em conformidade com o princípio do Tao. Essa alegria é para o Homem seu único repouso”.

Wagner – Interessante observar como o sábio constrói uma ponte entre o Lago e a Montanha: a alegria de caminhar conforme o Tao propicia a quietude, o repouso de um coração tranqüilo. E “profanando” esta bela imagem com um pouco de imaginação e bom humor, podemos imaginar a via inversa como um enorme tobogã, que desce da montanha e nos lança nas águas do lago! Pura alegria e diversão!! A partir da quietude da montanha não é preciso fazer força para chegar à alegria da satisfação: basta se entregar que a naturalidade faz o resto!! Esta já é uma razão mais do que suficiente para praticarmos a meditação! Cultivarmos a quietude interior e deslizarmos naturalmente para o lago de felicidade da plenitude interior, que se acumula espontaneamente dentro de nós.

Claro que também existem alguns “nós” pelo caminho… Afinal a montanha simboliza o impedimento, o obstáculo, a dificuldade. Subir uma montanha não é algo que se faça com pouco esforço…(Antes de escorregar no tobogã, precisamos subir longas escadas…) Mas os amantes da natureza sabem como o sacrifício vale a pena! Belas paisagens, ar puro, amplitude… Do alto da montanha podemos contemplar a grandiosidade da natureza, a imponência da criação, a infinitude do firmamento…

Da mesma forma, parar a agitação da nossa mente, aquietar os incômodos do corpo imóvel, reduzir a intensidade dos nossos ruídos interiores não se consegue de imediato, como acender uma lâmpada apertando o interruptor. A escalada pede perseverança, superação, disciplina. Mas o exercício também traz força, estabilidade e auto-confiança, além da amplitude de uma visão mais contemplativa da vida e de si próprio!

Ops! Naturalmente eu pulei da alegria para a quietude! Talvez já seja um efeito da transição do período…

Oscar – Bem, antes de fazer coro com você nos aspectos positivos e harmônicos desse período de transição, acho importante desafinar o coro dos contentes, e exercitar a capacidade crítica de reagir a influência externa. Se o homem não reflete as influências externas, e não exercita a capacidade de responder ao mundo, fica robotizado, e não consegue um intercâmbio crítico com a realidade, por isso ressaltei os aspectos perigosos e ilusórios quanto a conquista da alegria. Acho que o importante é a pessoa se perguntar e se conscientizar, sobre aquilo que realmente pode lhe trazer a alegria interior, e tentar perceber até que ponto não está amarrando a sua alegria interior com o constante desejo de ter e conquistar aquilo que é impermanente, excessivo e desnecessário. Tem gente que quando está angustiado só melhora quando sai para fazer compras no shopping.

No Yi Jing (I Ching) no hexagrama “Alegria” a 1a e a 2a são linhas harmônicas que pertencem ao Trigrama Inferior, o que revela que a verdadeira alegria é a alegria interna, baseada nos conceitos de retidão, harmonia e sinceridade.

A alegria interior torna o homem mais comunicativo e alegre, torna as pessoas suaves, comunicativas, capazes de ir em frente e encontrar o movimento de harmonização possível consigo mesmo, com suas relações e com o destino, em qualquer situação de vida. Essa alegria deve estar centrada na natureza intrínseca de cada um. O conceito de sinceridade no Yi Jing (I Ching), significa não apenas sinceridade no sentido comum, mas também retidão, ausência de erro, seriedade, ser verdadeiro com o seu eu real, ser verdadeiro com a natureza das coisas, realidade e verdade.

O comentário de Confúcio sobre o hexagrama “Alegria”, dá a dica de como a alegria interna gera fluidez externa e cria o prazer da reunião: “Um homem superior debate seu estudo entre amigos”. É isso aí! É preciso estudar, trocar idéias, debater e se relacionar com o outro e com o mundo. Ou seja: se comunicar com aquele que está a sua frente. Isso é a alegria!

Wagner – …E com aquele que está do outro lado da linha!!! Conversando a gente se entende, amplia o conhecimento e enriquece a convivência! Uma boca fala de cá, outra fala daí e seguimos acumulando a alegria de um debate prazeroso, como sugere o Hexagrama Alegria: um Lago em cima, outro embaixo.

Vale a pena ressaltar que a linha principal do trigrama Lago é uma linha Yin, na superfície, o que indica a abertura para que a água possa fluir, tanto para entrar, como para sair… E é justamente esta abertura que permite, além das trocas, a acumulação no interior do lago. Yin também é suavidade, tolerância, flexibilidade e receptividade: elementos essenciais para um bate-papo agradável! Quando falta o yin, o yang tende a ficar muito arrogante, intransigente e inflexível. Nesta hora, não tem mais conversa! O diálogo termina e começa o monólogo…

Aí a gente percebe outra propriedade interessante do diálogo: não dá para dialogar sozinho! É preciso ter pelo menos mais uma pessoa para podermos conversar. Quando não temos ninguém para conversar, começamos a falar com “bolas de futebol” ou coisas do gênero (lembra do filme “O Náufrago”?)! Porém, ao chegarmos neste ponto, não é preciso nem prestar muita atenção para percebermos o isolamento…

Oscar – O Yi Jing (I Ching) ensina que o indivíduo ao invés de ser percebido na perspectiva isoladora de um eu sujeito, é considerado como parte interessada na relação, o indivíduo existe mas não é passível de ser isolado. Cada consciência está continuamente em relação sensível com as outras, salvo quando se enrijece. Mêncio, filósofo chinês comentou: “todos os existentes encontram-se implicados em mim”, devemos nos esforçar para desenvolver a consciência dessa realidade em nossa conduta e assim tirar a consciência do entorpecimento em relação ao outro e ao mundo. Como dizia o Velho Guerreiro: “quem não se comunica se trumbica”

É aqui que entra o oráculo, se o homem não tem alegria no cotidiano, nas suas relações, ou no modo como recebe os acontecimentos da vida, à consulta ao I Ching, pode ajudá-lo na conquista da alegria de ser e de viver. Pois não podemos esquecer que o oráculo é um dos simbolismos do Trigrama Lago. É sempre bom ouvir os sábios conselhos do Yi Jing (I Ching). Não é a toa que na mitologia Hindu, Ganesha, o deus da sabedoria é simbolizado pelo elefante, que tem grandes orelhas para escutar.

O Yi Jing (I Ching) é a linguagem do Tao, é a possibilidade de acessar, conversar, indagar e se aconselhar com a sabedoria que permeia o universo. É possível “conversar com o Tao” através do oráculo, do estudo dos textos clássicos, e da compreensão e prática dos conceitos de filosofia, meditação e alquimia do Yi Jing (I Ching).

Segundo o “Senhor Felicidade” Shao Yong, o homem ideal é o Sábio, e a Natureza, o Destino e o Princípio são as questões fundamentais da vida. Por isso a função oracular do Yi Jing (I Ching) é tão importante na conquista da alegria de ser e de viver.

O Yi Jing (I Ching) é um instrumento que nos ajuda a investigar o Princípio inerente as coisas, para que possamos junto a elas, desenvolver a nossa Natureza e Consciência e cumprir o nosso Destino. O encontro da natureza e consciência do homem com seu destino, por meio do Princípio do Tao é segundo Shao Yong a verdadeira alegria: “pois de que outra forma é possível manter o Princípio e a nossa própria Natureza a não ser através do Caminho (Tao)?”.

Wagner – Sempre importante frisar que cumprir o Destino não é acomodar-se e entregar-se a uma situação já pré-definida! É compreender as leis que regem os movimentos do Céu, da Terra e do Homem, harmonizando-se às suas transformações. Não precisamos enfrentar, lutar, guerrear contra as forças naturais e as tendências do Destino. Isso desgasta a nossa energia e não traz resultados. O que o Yi Jing (I Ching) nos propicia é a compreensão sobre a nossa própria Natureza e o nosso Destino, para que possamos vivenciá-los de modo sábio e consciente.

Por isso os mestres taoístas respeitam e prestigiam os estudos do destino, em particular o Yi Jing (I Ching). Sem compreender como funciona o universo, como se harmonizar aos seus movimentos? Sem a consciência sobre a sua própria natureza, como se empenhar em uma transformação autêntica e consistente? O ideograma Rei, em chinês, escreve-se com três linhas horizontais paralelas, unidas por uma linha vertical no centro. As três linhas horizontais simbolizam o Céu, o Homem e a Terra. A linha central vertical simboliza a consciência do Homem, unindo os três poderes. Através dessa união, o Rei, que também simboliza a consciência no Yi Jing (I Ching), torna-se senhor de seu próprio Destino. Ou seja, para termos poder de transmutar verdadeiramente o nosso Destino, é fundamental o cultivo da consciência! Sobre o tempo (Céu), sobre o espaço (Terra) e sobre si próprio (Homem).

Com tudo isso, como não nos prepararmos para o que o Destino nos traz?… E o que é que vem por aí, Oscar?

Oscar – 20 anos de predominância da energia do Trigrama Montanha vem por aí. Tá na hora de começar a meditar com disciplina. A resposta do tema da quietude está na própria prática da meditação, basta “sentar no silêncio”. A mente humana poderia ser tão calma quanto a água parada do Lago. Sendo calma, ela será tranqüila, sendo tranqüila ela será iluminada.

Junto ao dever de casa das exigências da época, simbolizadas pela influência energética do calendário chinês, existem as exigências do dever de casa particular, exclusivo de cada um de nós, de encontrar de acordo com sua natureza, princípio e destino, o movimento de harmonização possível em cada momento, situação e circunstância da vida. A integração do destino pessoal com o destino cósmico é a verdadeira fonte de alegria e quietude.

O Yi Jing (I Ching) é o tratado das mutações. Quando observamos as mudanças do mundo, através dos fatos, das notícias e da dinâmica da história, quando observamos a vida que levamos, estamos observando as mutações descritas pelo I Ching. Portanto quanto maior a capacidade de compreensão e articulação dos códigos do I Ching, maior será a capacidade de compreensão e interpretação das mudanças em curso em nossas vidas e no mundo. Quanto maior a capacidade de raciocinar o mundo, maior capacidade de atuar na transformação, se transformar e transformar o próprio mundo.

A transformação vive um rico momento histórico. Vamos caprichar! Subir o topo da montanha interior e entrar no mundo com quietude sem perder o movimento. Montanha simboliza aquilo que é imóvel, é reflexão sobre o parar. É preciso cada um contemplar onde está parado nesse exato momento de sua vida, e se perguntar como na gíria: “tô mal parado?”, ou então cantar como aquela canção: “por quê parou? Parou por quê?”. A montanha está na frente do andarilho e lhe obriga a questionar o seu destino…Desafios, questionamentos, interrogações, reflexões… Quando o coração está quieto tudo fica quieto. É na quietude que se revela o sentido do Caminho.

Bem, acho que o espaço acaba aqui, e também aqui está na hora de parar. Valeu Wagner! É sempre uma alegria e uma tranqüilidade conversar com você.

20 anos de Montanha começam a partir de 2004, e a montanha representa o sábio, o eremita, só que hoje em dia o eremita não se isola, e sim atua com lucidez na dinâmica do mundo, está no front, está no coração dos acontecimentos. O I Ching ensina a atuar no princípio do curso das influências que vão formar a realidade. Talvez mais importante do que entrar o ano com “pé direito”, seja parar para adquirir a consciência do movimento, ficar quieto antes de dar o primeiro passo. A entrada do ano é um ponto chave de reflexão, mas cada um tem a possibilidade de descobrir pontos chaves de reflexão a cada instante, sem precisar depender da data oficial do “ano novo”.

Alegria! Alegria! A Quietude vem aí! Feliz 2004 leitores, mas não se esqueçam de caprichar!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *