O Equilíbrio do Universo

Artigo publicado na revista Casa & Decoração Especial Feng Shui em CASA – Ano 4 – nº 18

O EQUILÍBRIO DO UNIVERSO Para o Taoísmo, tudo o que existe no mundo é formado por duas energias complementares, como explica o sacerdote Wagner Canalonga Textos: Glau Gasparetto

FALAR SOBRE o Feng Shui e não mencionar o I Ching é como tratar de Engenharia e esquecer a Matemática. Base de toda a teoria de harmonização de ambiente e, mais que isso, de todo o pensamento taoísta, o I Ching é tão antigo que sua origem se perde no contexto histórico. O que é certo é sua proposta de fazer o homem alcançar o caminho da harmonia consigo mesmo, com o céu e com a terra.

Segundo o Taoísmo, todo o universo é resultado do equilíbrio entre duas energias cósmicas: yin e yang, presentes em tudo, seja nos micros ou nos macrossistemas. Em determinados aspectos, a energia yin pode aparecer em maior quantidade; em outros, pode ser a yang a predominante. “Mas no universo inteiro, se colocarmos na balança, vamos ter um resultado equilibrado”, afirma Wagner Canalonga, sacerdote taoísta, regente do Templo de São Paulo da Sociedade Taoísta do Brasil, psicólogo, acupunturista, professor e consultor.

Desde o inicio, o I Ching é usado como oráculo, que recorre à sabedoria da natureza. É como se através dele, a natureza respondesse aos questionamentos humanos, apresentando evidencias da realidade através de hexagramas e arquétipos. “ A grande arte é justamente a contextualização desses elementos”, explica o sacerdote. Hoje, aos 36 anos, Canalonga traz no currículo todo o estilo do seu mestre, Wu Jyh Cherng, desde o tai chi chuan, passando pelo Feng Shui, até a astrologia chinesa. Ordenado sacerdote em 2003, ele conversou com a Feng Shui em Casa sobre o I Ching.

Feng Shui em casa – Como surgiu o I Ching?

Wagner Canalonga – A principio, o I Ching pode ser visto como uma leitura filosófica, que surge no momento em que o mestre observa a natureza, como ela se transforma e começa a codificar as informações que ela repassa. A base de tudo são duas energias cósmicas, yin e yang, presente em todos os sistemas. O I Ching tem uma idéia muito dinâmica, pois a cada instante tudo muda e você tem de acompanhar essas transformações. Através da codificação do I Ching, temos uma síntese das leis mutantes e das imutáveis, que são as que regem o universo. Cabe a nós interpretarmos, o que ele nos mostra através dos 8 arquétipos e dos 64 hexagramas, que mostram 64 tipos de configurações de uma determinada circunstancia, seja grande ou pequena.

FS – Qualquer pessoa aprende o I Ching?

WC – Qualquer uma; algumas com mais facilidade, outras com menos, mas existem técnicas de desenvolvimento. O I Ching é algo muito lógico, é o casamento do yin e do yang, em que o yin está relacionado ao aleatório, ao misterioso, ao intuitivo, e o yang, ao estudo e ao raciocínio lógico, é técnica, é filosofia. O yin é escuro, não sabe, nem pondera, mas não é porque não é enxergado que não existe. Já o yang explica o que a gente enxerga, compreende. A boa consulta, assim como a boa compreensão do I Ching, combina esses dois elementos.

FS – Como entender o I Ching?

WC – A primeira preocupação é entender as mutações e a relação do homem com os ambientes, internos e externos, em que ele vive. O I Ching pode ser aplicado às varias áreas das vidas das pessoas como o corpo, a saúde, o ambiente ou o próprio dia-a-dia. Toda a medicina chinesa é fundamentada no equilíbrio entre o yin e o yang; na estratégia, o I Ching aponta como levar vantagem na disputa; na casa, aplicando o I Ching, desenvolvemos o Feng Shui. O I Ching é como a Matemática – é puro e aplicado em diferentes contextos. Por isso é a base de tudo.

FS – Sempre a natureza é responsável?

WC – A maior realidade que nos abraça são o céu e a terra. Nós somos o recheio do ‘sanduíche’. Nos trigramas, a linha de cima representa o céu, a do meio, o homem e a de baixo, a terra. Temos um pouco de céu e de terra. Nossa linha é a do meio, o que mostra que o nosso caminho é o do equilíbrio.

FS – Por que é difícil encontrar o equilíbrio?

WC – Porque ele é dinâmico. O que é equilíbrio aqui, lá pode não ser. As pessoas precisariam ser livres de preconceitos para acompanhar as transformações do céu e da terá. Nós também nos transformamos. Gostamos de crescer e, para isso, trabalhamos. A vida não é só uma progressão. É um circulo, sempre dinâmico, em movimento constante. O verdadeiro equilíbrio é acompanhar as mudanças. Se eu gosto muito de batata, mas o médico me manda parar de comê-las por causa da saúde, o equilíbrio está em saber acompanhar essa nova realidade, essa determinação. O equilíbrio pede ponderação e consciência.

FS – Como saber qual o meio termo?

WC – Ainda que não se saiba exatamente onde está o ponto de equilíbrio, sabemos onde ele não está: nos extremos. Fazer uma dieta rigorosa é um extremo e não significa equilíbrio. Assim como bater em um filho, num momento de falta de controle.

FS – E na casa?

WC – A mesma coisa: o excesso de vento não é bom, assim como pouco vento também não é. É preciso observar o ambiente, ver o que precisa ser feito. E lembrar que tudo se transforma. Você compra flores para embelezar a casa, para trazer harmonia e beleza, mas as flores murcham com o tempo e acabem deixando feio o ambiente. O imóvel, com o tempo, vai se deteriorando, por isso é preciso cuidar dele.

FS – Como é adequado aplicar o Feng Shui?

WC – O melhor seria se conseguíssemos construir o imóvel já com os fundamentos do Feng Shui, conhecendo o mapa natal e, depois periodicamente, fazendo a analise do transito de energias, principalmente para trabalharmos com imprevistos. Mas como nem sempre podemos lidar com o ideal, também podemos utilizar as ferramentas do Feng Shui para corrigir as desarmonias energéticas, aproveitar os pontos positivos do imóvel e tomarmos as preocupações para lidar com o que não for possível corrigir.

FS – É possível antecipar os problemas?

WC – Varias técnicas nos permitem antecipar tendências. Uma delas é a da Estrela Voadora: observando-se a confluência das estrelas, é possível saber quais as probabilidades que podem ocorrer. É uma analise das tendências. Analisamos as potencialidades do que pode acontecer e as trabalhamos, sendo que algumas avaliações podem ser mais dinâmicas do que outras.

FS – Falando sobre Estrelas Voadoras, hoje não são muitos os consultores que se especializam em certas escolas, como esta e a do Bazai, por exemplo. Isso não faz com que se perca uma parte ou se deixe de difundir completamente a tradição milenar do Feng Shui?

WC – Há chances sim. Na verdade, romper a barreira do difícil permite maior grau de precisão no diagnostico e no tratamento das desarmonias. Com ferramentas superficiais, só são obtidos resultados tênues. Para resultados mais consistentes, é necessário utilizar ferramentas mais adequadas. É uma pena as pessoas deixarem de estudar porque acham difíceis as escolas. Mas algumas pessoas não se intimidam com a barreira do achar que é complicado e, com tempo, vão entendendo, percebendo como os mecanismos estão interligados. Tudo é interligado.

FS – A proliferação de consultores no mundo todo também é grande. Isso é bom?

WC – Sempre que se populariza, é preciso criar mecanismos para a fácil compreensão. Neste contexto, pode-se perder um pouco do principio, mas se o Feng Shui não fosse popular, eu não estaria aqui falando com você. A popularização tem o aspecto negativo de vulgarizar o conhecimento, perdendo um pouco da essência, mas tem outro lado, o positivo, de difundir o conhecimento. A popularização atinge um numero maior de pessoas, que podem se interessar pelo assunto, aprofundando-se posteriormente.

FS – Acha o Feng Shui muito ocidentalizado?

WC – Vejo que cada vez mais há uma aproximação do conhecimento do Oriente com o do Ocidente. E isso é muito bom, pois ambos podem aprender muito um com o outro. Nesta união, há ganhos para todos. Porem, tembem é necessário ter bom senso para sabermos diferenciar o essencial do superficial nesse encontro. Por exemplo, dentro do Feng Shui, há muitas propostas de correção que utilizam elementos culturais da China, pelo fato de esse ser o local de origem da técnica, como talismã, selos de proteção, objetos de decoração, etc. Contudo, a utilização destes elementos não deve afetar um principio básico do Feng Shui, que é a naturalidade. Posso identificar na minha cultura local outros elementos que cumpram a finalidade da correção original proposta, sem ter que adotar uma decoração chinesa para a minha casa. Da mesma forma, na fitoterapia, posso utilizar ervas locais, mais accessíveis baratas, para ter efeitos similares ou correspondentes às ervas de origem chinesa. Claro que, para realizar essa adaptação das técnicas, é necessário conhecer profundamente a essência dos ensinamentos. Compreendendo os princípios fundamentais, podemos flexibilizar as técnicas, adaptando-as ao nosso contexto. Esta é a verdadeira união. E justamente por isso os nossos alunos de Feng Shui são orientados a consolidar seu conhecimento através do estudo do I Ching. Buscando a origem dos ensinamentos, eles aprendem como beber água direto na fonte!

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