No Yi Jing (I Ching), o Zero é o vazio grávido das Galáxias, do Homem e da História. O espírito do Vazio é a base da filosofia Taoísta e o estado correto para uma consulta oracular. assim, como todas as estrelas do céu estão dentro do vazio, estar vazio é ter o universo dentro de si.
Oscar Maron Professor e consultor de Yi Jing (I Ching) Flor de Ameixeira e Yi Jing (I Ching) Clássico Editor do jornal “Tao do Taoísmo”
Jornal Tao do Taoísmo – n. 12 índice
O Zero é a mãe de todos os números, o Infinito, o Absoluto em forma de número.
Hexagrama Zero
Na cosmologia do Yi Jing (I Ching) o hexagrama número Zero – ABRANGÊNCIA, é composto de seis linhas Yin (- -) que se caracterizam pelo vazio interno e simbolizam o vazio que abraça todas as coisas. Esse vazio não é vacuidade, a ausência da expressão, e sim a potencialidade criativa de todas as expressões; o vazio que permite todas as coisas existirem dentro dele.
Na concepção Taoísta, esse Vazio (Wu Ji) é a condição preliminar para a criação do Universo e representa a essência, o néctar primordial de onde tudo emerge. No Zero foram criadas as partículas que constituíram o início do Universo, os átomos que forjaram as estrelas, as moléculas que se constituíram na Terra e em todos os outros mundos… e tudo isso encontra-se no interior de nós mesmos. É no núcleo do Vazio que são gerados os 64 hexagramas do Yi Jing (I Ching), síntese do Ciclo das Mutações que rege a realidade.
O Retorno ao Zero
No Taoísmo, voltar ao Zero é encontrar o pleno vazio interior, onde todas as possibilidades de Forma, Existência e Linguagem estão contidas. Quem encontra o Zero através do vazio interior, possui todos os recursos fluindo dentro de si. Assim tudo que é dele pertence ao mundo e tudo que é do mundo pertence a ele.
A busca desse vazio interno que traz quietude e lucidez é a base da filosofia Taoísta e o estado correto para uma consulta oracular do Yi Jing (I Ching). Ao manter a mente esvaziada, a mensagem do oráculo se manifesta com mais lucidez. Quanto maior o grau de vazio, quietude e transparência, maior será o grau de precisão das respostas.
Após analisar seu momento pessoal, situação e circunstância de vida, seja ela qual for, lembre-se: o Yi Jing (I Ching) deixa muito claro no próprio título da obra, Tratado das Mutações, que tudo que existe no Universo está em constante mutação. Reagir às transformações da vida é o Apego, não saber acompanhar essas mudanças é a Carência de Naturalidade.
O Sábio não tem idéia
Quando Confúcio, um dos autores dos textos do Yi Jing (I Ching), declarou detestar a Teimosia, erraria quem visse nisso um traço de caráter. Na verdade, como bem observou o filósofo e sinólogo francês François Jullien, Confúcio revela uma apreensão sobre travar uma posição particular que impeça a renovação (Karma em chinês significa Aquilo que impede a fluidez), pois se o “Sábio não tem idéia” é porque não privilegia nenhuma, e assim, automaticamente, não exclui nenhuma.
O Sábio aborda o mundo sem nenhuma visão preconcebida e, do mesmo modo, não tem posição formada, não se imobiliza em nenhuma posição. O Sábio evita projetar uma necessidade qualquer, e toma o cuidado de não se apegar à posição adotada, a posteriori. Estando o real em contínua transformação sua conduta também está.
O Sábio não tem Eu, porque o Eu é demasiado estreito para responder a real necessidade do mundo e sua perspectiva permanece totalmente aberta: como não privilegia nada, tudo pode abraçar e nada impede a sua contínua renovação.
Na prática espiritual da meditação, esse estado de Zero pode ser experimentado quando o praticante torna-se totalmente Yin: passivo, quieto e vazio para receber a força Yang ativa, que anima o universo, as estrelas e os organismos dos seres vivos.
Meditar é purificar o coração, é voltar ao Zero. Voltar ao Zero traz quietude, a quietude traz estabilidade, a estabilidade traz serenidade e a serenidade traz paz. Na paz pode-se pensar, e então, pode-se agir.
No centro do Zero, existe uma abertura de 360 graus, ou seja, o campo de ação externa é Infinito. Quem está no eixo do Zero não tem posição definitiva, mas está completamente imóvel no seio de sua imobilidade e pode evoluir constantemente, para responder sem cessar ao que a situação exige.
A Exclusão se desfaz
Confúcio declarou em Conversações (capítulo XVIII, 8): “e, se sou diferente de todos eles e não me enquadro em nenhuma categoria, é que não há para mim nada que, por princípio, seja possível ou não possível, a ser feito ou não ser feito, que convenha ou não convenha”. Em outras palavras, não é mais o Eu que exclui, mas é a exclusão que se desfaz.
O caminho da Sabedoria é como a imagem da balança, que não tem posição fixa, varia conforme o que ela tem de pesar e o equilíbrio é sempre particular. Esse caminho da regulação é o caminho do Tao.
“Um Yin um Yang, eis o que se chama o Caminho”, o espírito do vazio ensina o desapego e a suavidade como condições essenciais para viver o Yin e o Yang, o avanço e o recuo, a expansão e o recolhimento, inspirado pelas mutações que expressam a vida real.
Para refletir: se na Matemática do Yi Jing (I Ching), o hexagrama Zero é a condição anterior a criação do Céu e da Terra, e, se o Sábio se coloca na condição anterior ao Céu e a Terra, como podem então, o Céu e a Terra contrariá-lo?
É no núcleo do Vazio que são gerados os 64 hexagramas do I Ching.