A distinção entre “taoísmo religioso” e “taoísmo filosófico”, em vigor para intelectuais do ocidente por muitos anos, está cada vez mais tênue. Hoje, há uma visão mais coesa do que é o taoísmo: livros de arte e história mostram a interdependência entre filosofia e prática espiritual.
Débora Dines jornalista
Fotos: Catálogo da mostra “Taoism and Arts of China”, The Art Institute of Chicago
Durante grande parte do século XX, quando o pensamento chinês começou a ser mais aprofundado em centros acadêmicos europeus, uma cisão marcou o enfoque dos sinólogos.
O taoísmo, uma das mais antigas religiões da China, era o fundamento tanto de textos filosóficos (Lao Tzé, Chuang Tzu, Lieh Tzu) Como também de ciências e artes (medicina, dietética, Tai Chi, Qi Gong, astrologia, I Ching, Feng Shui, entre outras) – fascinantes objetos de estudo para quem descobria o poder de estudo do símbolo e da representação. Mas para estes estudiosos pioneiros na divulgação da cultura chinesa no Ocidente, havia uma contradição em reunir no mesmo pacote tão rica e antiga cultura junto a uma religião.
Era mais fácil desunir, seja porque os primeiros sinólogos eram missionários na China e não podiam demonstrar encantamento com a crença tão alienígena, seja porque não era de bom tom os estudiosos de filosofia europeus considerarem uma religião. Era melhor fazer uma distinção entre a religião que dava base a um pensamento metafísico, e a essência filosófica que alimentava os rituais e práticas espirituais. Convencionou-se o uso dos termos “taoísmo filosófico” e “taoísmo religioso” para discriminar o que nunca deveria ser diferenciado, já que o “taoísmo religioso” é simplesmente a prática do “taoísmo filosófico”.
Hoje, cada vez mais tal distinção se enfraquece – embora o Tao Te Ching, de Lao Tzé, continue a ser um dos mais vendidos e traduzidos livros do mundo, mas nunca se menciona que seu autor é cultuado como divindade taoísta e sua obra é a base de uma religião. A magnífica exposição “Taoism and the Arts of China” montada no ano passa pelo Art Institute of Chicago, nos EUA, ou acadêmicos que publicam obras dedicadas ao reconto desta história, como Isabelle Robinet e Lívia Kohn – ambas colaboraram na montagem da exposição e redação dos textos do catálogo da mostra – provam que o Ocidente finalmente se rendeu a uma compreensão mais ampla e coerente do taoísmo.