O taoísmo não encara um Iluminado como se ele fosse uma lâmpada acesa, que precisasse ficar o tempo todo lançando raios de luz para todas as direções.
Wu Jyh Cherng, Sociedade Taoísta do Brasil
Jornal Tao do Taoísmo – n. 13 índice
Equilíbrio é tudo aquilo que consegue harmonizar os opostos e essa harmonia é basicamente resultado de uma consciência que ilumina tanto para dentro, quanto para fora da pessoa. Consciência que ilumina para dentro é a lucidez que leva uma pessoa a compreender-se a si mesma, com todas as suas possibilidades e impossibilidades, aquilo que espera do mundo e de si mesma e aquilo que tem ou não capacidade para realizar; e consciência que ilumina para fora é a lucidez que faz a pessoa compreender o mundo exterior, o pensamento das outras pessoas, de que maneira o mundo reage diante da multiplicidade de solicitações, o que é tolerável e aceito pelo mundo, pelas pessoas com quem ela convive e pelo tempo e lugar em que ela vive.
Se a pessoa continuar avançando na sua prática, mais alto e sutil será o nível de qualidade da quietude.
Esse modelo de comportamento mostra que o taoísmo não encara um Iluminado como se ele fosse uma lâmpada acesa, que precisasse ficar o tempo todo lançando raios de luz para todas as direções, procurando iluminar tudo que considera obscuro; pelo contrário, a pessoa iluminada é aquela que acende, de fato, no seu interior uma luz que não se apaga, mas deixa transparecer essa claridade no exterior demonstrando capacidade em conduzir sua vida sem atritos. Para isso, a pessoa não necessita, nem mesmo, ser um religioso ou místico, basta apenas ter a consciência expandida no nível da completa lucidez, mas para alcançar esse grau de consciência é preciso começar o processo cultivando a quietude, que se expressa em níveis diferentes de qualidade.
Se quietude para uma pessoa, no início da prática da meditação significa manter a calma quando, por exemplo, alguém lhe dirige uma palavra de falsidade ou um gesto descortês que a deixa abalada internamente, depois de alguns anos de prática, a quietude será algo muito mais sutil, a ponto desse mesmo gesto não lhe causar qualquer aborrecimento. Mas se a pessoa continuar avançando na sua prática, mais alto e sutil será o nível de qualidade da quietude que alcançará até chegar a um estágio em que passa a compreender aquele gesto hostil, considerando o contexto e a circunstância em que foi praticado.
Prosseguindo com a meditação, a pessoa subirá de nível e finalmente alcançará o estágio de consciência em que enxerga aquele gesto como uma expressão do universo que tem manifestações distintas, dependendo da característica de cada pessoa. Isso mostra que depois de alguns anos meditando, a pessoa percebe que está alcançando degraus cada vez mais altos de quietude, que ela vai galgando na medida em que se mantém com constância no Caminho. A pessoa muda de nível porque a própria quietude também muda de qualidade e assim o praticante vai ampliando sua lucidez e passando a enxergar um universo cada vez maior, que existe ‘do outro lado do muro’.
Quando o muro deixa de existir, o Mistério é revelado.
No taoísmo entendemos que a vida se apresenta como se estivesse cercada por um muro que impede as pessoas de conhecerem o que existe do outro lado. Na medida em que amplia o nível de sua consciência, no entanto, a pessoa vai derrubando aos poucos essa barreira e começa a enxergar cada vez mais longe.
Os muros são infinitos, cada vez mais sutis, de uma dimensão cada vez maior e colocados um atrás do outro; assim, conforme um praticante da meditação do silêncio vai entrando em experiências místicas mais profundas, seus muros vão sendo retirados e aparecendo outros mais sutis, num universo que se amplia infinitamente. É nesse universo ampliado que o Mistério se revela, aos poucos, porque se Mistério é tudo aquilo que está ‘do outro lado do muro’, quando o muro deixa de existir, o Mistério é revelado. Com isso, a pessoa começa a ter contato com um universo cada vez mais amplo e sua compreensão vai se ampliando também, até alcançar o estado da Absoluta Iluminação.
A busca da restauração da lucidez interior, ou Iluminação, é o caminho do taoísmo.
Quem chega a esse estágio de lucidez passa a agir com um grau de consciência mais elevado, que a levará ao equilíbrio e harmonia na convivência de ‘eu comigo mesmo’, ‘eu com os outros’ e ‘os outros comigo’. A harmonia interior gera menos atritos. Se toda a humanidade conseguir diminuir os atritos que surgem na convivência entre as pessoas, haverá mais afeto e paz no mundo. Mas, para chegar a esse ponto, é preciso, primeiro, expandir a consciência para restaurar a lucidez interior. Essa busca da restauração dessa lucidez interior ou Iluminação, é o caminho do taoísmo.
Para encontrar a lucidez interior, até chegar à infinitude, precisamos começar cultivando a quietude interior.
Da mesma forma que a alma de uma pessoa está aprisionada dentro do seu corpo, a consciência de cada pessoa está aprisionada dentro de um mundo de impermanência, incerteza e ignorância. Para romper essa barreira e conseguir encontrar a lucidez interior, que vai permitir a ela enxergar o que está além da fronteira da vida e da morte, até chegar à infinitude, ela precisa começar cultivando a quietude interior.